sexta-feira, abril 25

RETRATO

Beja cidade de afectos - por enquanto ainda não - porque esses ficaram algures pelos campos, de onde são originários um numero muito considerável de habitantes da urbe ( exemplo disso é a fuga em massa para as aldeias, nos fins de semana e feriados), lá, procuram-se esses afectos e o tão necessário apoio económico, dado pelos pais, para suportar a dificil vida da cidade.

Cidade onde a qualidade de vida é evidente, mas de que poucos se orgulham e usufruem. Com tempo para a familia, para os amigos para o lazer.
Quanto a este ( lazer), apesar da diversidade da oferta e dos critérios na selecção dos espectáculos, assumindo assim os agentes culturais o seu papel pedagógico, não há motivação para a frequência dos mesmos.

Na noite de ontem passou pelo palco instalado no Parque da cidade, espaço por sinal muito aprazível e sobretudo com a noite que estava, mais convidativo se tornava, uma banda, Couple Coffee que nos trouxe um espectaculo " Co´as tamanquinhas do Zeca"; resultado, 1-0, perdeu o executivo camarário que apostou neste tipo de espectáculo e muito bem quanto a mim, mas não para a grande maioria do público que assistia ao mesmo.
Nas proximidades do local onde me encontrava, estava patente ao público um quadro verdadeiramente hilariante , não sei se melhor este se as "bocas" verbalizadas pelos intervenientes do referido quadro. Não sei se foram os autores da obra prima, se o zé povinho que atribuiu o nome de "brigada dos bochas", ao dito quadro; originadas as mesmas, penso eu, pelos barris de cerveja já ingeridos, misturado com as farturas impregnadas de oleo com kilómetros, disponiveis no recinto.
Depois de uns valentes berros com os filhos que se rebolavam na relva existente e se encavalitavam em cima uns dos outros, e outros tantos com as consortes porque massacravam e exigiam circulação pelo recinto ao invés da estagnação pretendida por eles para mais umas rodadas de cerveja, comentavam - isto é quéi o Zeca? Mas o qué qué isto?
Apesar do meu trabalho exigir proximidade a esta realidade, foi-me dificil e doloroso naquele contexto, porque as minhas expectativas ainda são algumas, ver um quadro com esta qualidade, mais penoso ainda porque o mesmo era vivenciado por individuos de uma geração nascida pós 25 de Abril de 1974.
Logo eu que estava a viver tão intensamente tudo o que ali se passava, porque são poucas as oportunidades que tenho para estes banhos de multidão - a música, as luzes, o próprio cenário tão natural de todo o espaço envolvente, que é maravilhoso - naquele momento só me ocorria um pensamento " espectáculo demasiado herudito para este público" e consegui apesar de tudo, rir sózinha.
Estava eu perante um público apático, envelhecido, não pelos anos, mas pelas mazelas deixadas pelas sucessivas politicas dos desgovernos deste país e a que estes jovens não souberam ou não quiseram dar resposta. Jovens tristes, carregados de filhos, mais filhos das mães do que própriamente dos pais, jovens, sobre quem recai o peso da responsabilidade de constituição de uma familia, não pela necessidade de partilha, de carinho, mas medo da solidão. Vidas de verdadeira escravidão da ostentação, e das aparências, rostos sem alegria, completamente AMORFOS.

10 comentários:

Susete Evaristo disse...

Depreendo das tuas palavras a confirmação da falta de cultura de uma geração a quem deveveria ser entregue a responsabilidade da continuação de Abril.
Infelizmente nem todos de nós, os de mais de 50 anos, que vivemos uma juventude onde as faltas eram mais do que as farturas, conseguimos alcançar para depois transmitir, os conhecimentos que fariam da geração de agora pessoas culturalmente preparadas. Os jovens de agora, embora não encontrem pela frente as barreiras que nós tivemos encontram outras. Desde logo os extensos programas escolares, que, são dados a correr sem tempo de revisões, a sobrecarga horária que em vez de os insentivar os afasta.
Por outro lado o facilitismo da informática. Parece contraditório mas não é. Depois a falta de perspectivas futuras com ou sem formação académica.
Enfim, eu pergunto, para onde vai Portugal ?

Susete Evaristo disse...

Ontem esqueci de dizer que pôr crianças de 11 anos, como o meu neto, a ler "Os Miseráveis" de Victor Hugo, não será a melhor opção para os insentivar à leituira. É uma grande obra que trata um problema que pode considerar-se actual dada a (in)justiça social existente, mas acho-a forte demais para crianças de tão tenra idade.

Mar disse...

mUito boa questão que levantas susete, várias vezes tenho reparado nessa desadequação a nível de programas escolares, em relação á idade dos que queremos ensinar...

Miga xica, este post está muito bom. Também eu reparei nisso nessa noite. As pessoas não sabem disfrutar da vida é tão sómente isso.
Não sei se é coisa da idade. Ontem, no concerto dos Xutos, pude ver uma outra geração, (e também alguns dessa mesma que descreves aqui...) em euforia. Não sei se é coisa de motivação. O que sei é que há pérolas que são dadas a porcos.

Alan Romero disse...

Olá Xica,
Desculpe a invasão! Sou amigo dos Couple Coffee e estava à procura de notícias sobre o concerto de Beja. Assim cheguei aqui, graças ao Google.
Compreendo perfeitamente o teu desabafo, já senti o mesmo muitas vezes. Nem sempre o público está preparado para o que vai ouvir, e parece-me ter sido o caso. Os Couple Coffee ainda não são conhecidos do grande público, então temos que encarar com naturalidade o seu espanto diante da modernidade das versões que a banda fez para os clássicos do Zeca Afonso. A expectativa certamente era ouvir versões mais obedientes aos originais. Nem todos os ouvidos estão aptos a apreciar o novo, precisam de mais tempo. Isso é mesmo normal, não há nada a fazer.
Felizmente havia gente atenta como você! Tomara que eles não demorem a apresentar-se em Beja, desta vez num teatro ou auditório. A questão do ambiente é muito importante. É possível que esse mesmo público tivesse prestado mais atenção se estivesse numa sala fechada, não só pelas melhores condições acústicas, mas principalmente pela atmosfera de concentração, mais adequada a um concerto tão sofisticado quanto o dos Couple Coffee.
Enquanto esse dia não vem, sempre resta a hipótese de ver o videos que estão no sítio da banda:
http://www.myspace.com/couplecoffee
Parabéns pelo blog, e por seres tão sensível!
Alan

XICA disse...

Meninas fiz um intervalo na prancha de SURF e vim dar uma volta. Em relação aos programas escolares, não opino, porque não sei nada, sei apenas que quando eu tinha 14 anos, a minha professora de português me pôs a ler Manuel da Fonseca, e em casa o meu pai, achou que era boa altura de eu ler " A Mãe" de Máximo Gorki, não sei se de alguma forma respondi a alguma duvida, que houvesse, sobre a minha opinião. Será que os pais, mais por egoismo não alimentam demasiado a infantilidade das crianças? Será que não são os próprios pais, que numa de comodismo, vão protelando os ensinamentos e o confronto com a realidade pura? Não sei, só fui filha e madrinha, em ambos os papeis e porque no segundo me foi permitido, pelos pais, não me dei nada mal, embora numa determinada altura tivesse sido apelidade de megêra, não me ralei, porque hoje, com 24 anos, eu tenho muito orgulho nele. Afinal é também um pouco de mim que ali foi investido e bem.

XICA disse...

Alan, quanto ao espectáculo, efectivamente o post peca pelo facto de eu opinar pouco, sobre aquilo que verdadeiramente interessa, O Grupo, eu já conhecia a banda através de um amigo que trabalha em rádio, ao vivo, apesar da panorâmica que me rodeava e da qual acabei por me alhear, são fantásticos - a voz, a música - gostei imenso, e depois tinha a vantagem de ser num local verdadeiramente lindo.

Susete Evaristo disse...

Miga respeito a tua opinião mas, não concordo com ela.
Além de "Mãe" de Maximo Gorki que também li pelos meus 15 anos, li outras obras à data proibidas como sabes, mas temos de convir que a mentalidade dos 15 ou mesmo 14 anos é muito diferente de uns 11 anos acabados de fazer. Há um tempo para cada coisa e a meu ver, (embora aceite os pontos de vista contrários) já basta que hajam crianças que são velhos desde que nascem que pelas mais diversas razões não tiveram condições de ser crianças. Não, não é por egoismo que devemos respeitar um tempo de inocência e naturalidade que o mesmo é dizer de ser criança, pelo contrário não devemos é, por egoismo não deixar que esse tempo ocorra. Depois, tem toda uma vida - passada essa fase de ingenuidade e sonho - para enfrentar a realidade e só se tem força para isso, se se tiver tido uma infância sólida e bem construida, com capacidade de sonhar. Já dizia o poeta: "O sonho comanda a vida"

XICA disse...

Susete, não estamos a discutir, estamos apenas a opinar sobre educação de crianças e como te digo com imensa pena minha, não por impossibilidade, mas porque não encontrei alguém que eu entendesse merecer ser pai de um filho meu, acabei não educando nenhuma, apenas participando na educação de alguns, como madrinha e depois como professora. E continuo dizendo que o conjunto de tudo em dose q.b não faz com que se perca a capacidade de sonhar, muito pelo contrário. Eu própria que fui educada, por duas pessoas completamente diferentes no que se refere a padrões de educação, um austero e o outro sonhador fizeram de mim esta amalga, para quem há duas coisas na vida imprescindiveis, AMOR e NATUREZA, há um exercicio que tenho que fazer diáriamente, CONTEMPLAR A NATUREZA e SONHAR .Há quem prefira fazer palavras cruzadas!

Alan Romero disse...

Xica,
Folgo em saber que, apesar de algum ruído à tua volta, mesmo assim deu para apreciar o concerto.
Falei hoje com a Luanda pelo msn e não pude deixar de falar no teu comentário. Ela manda beijinhos para ti. Disse-me que lá no palco tudo foi uma festa. Havia gente cantando junto e isso passou uma energia boa para eles. Ainda bem.
Fiquei a imaginar a cena do concerto na praça. Adoro Beja!
Abs

XICA disse...

Alan, não há regras sem excepções e felizmente, naquele recinto as excepções foram muitas, deu para perceber que efectivamente junto ao palco estava um grupo dinâmico, que conseguiu acompanhar, pelo menos as músicas mais conhecidas; e no próprio recinto em geral também havia muito quem soubesse apreciar o tipo de música da banda, eu é que sou muito exigente, e gostaria de não ver cenas do tipo da que descrevi. Alan em relação ao ALENTEJO, não sei se para alem de Beja também conheces uma outra cidade que dista desta cerca de 30 KM, se não conheces, aproveita em Junho, pelo MERCADO CULTURAL, conhecê-la, ver e ouvir Gilberto Gil, em grande.
Um abraço também para a Luanda e toda a banda, "portaram-se muito bem".